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segunda-feira, 4 de abril de 2016

Todas as revoluções são pós-revolucionárias


Por José Adelino Maltez


Todas as revoluções são pós-revolucionárias, já dizia Ortega y Gasset. E confirma-se, aqui e agora, com o ciclo desencadeado depois de 25 de abril de 1974, especialmente quando se institucionalizou a Constituição de 1976, depois de um breve parto de turbulência criativa. Com efeito, fez-se uma mistura entre o que estava e o que tentou projetar-se, ficando um sincrético de velhas divergências e novas convergências, num médio prazo marcado pelo soarismo e cavaquismo, tanto nos governos como nas presidências, que geraram um raro armistício da nossa história contemporânea. Por outras palavras, consolidou-se um péssimo regime que, apesar de tudo, é o menos péssimo de todos quantos tivemos.

Continuando Ortega, confirma-se que "uma revolução inteira é um processo dialético, em que a tese é dada por uma certa situação histórica, a antítese por uma ideologia que procura antepor‑se‑lhe, e, finalmente, a síntese, pela revolução em sentido restrito, em que se fundem numa unidade nova os elementos anteriores." Mas qualquer observador de bom senso sabe qual é a diferença entre a ditadura derrubada em 25 de Abril de 1974 e uma democracia pluralista e de sociedade aberta. São incomparáveis. O que temos é bem melhor do que estava. A liberdade vive-se, não precisa de ser demonstrada.
Com efeito, os três principais momentos criadores deste regime têm a ver, primeiro, com as eleições para a constituinte, de 25 de Abril de 1975, com resultados anti-situacionistas. Segundo, quando os restos da carbonária defenderam a emissora católica portuguesa, contra o assalto da extrema-esquerda. Terceiro, quando Soares, no comício da Alameda, apoiado pelas estruturas católicas, demonstrou que a força da rua era favorável ao pluralismo democrático e à sociedade aberta. O 25 de Novembro de 1975 confirmou o 25 de Abril de 1974 e o PCP continuou no governo.
Infelizmente, há muita gente que não repara como a esquerda e da direita que temos, ambas nasceram nesse “dia claro e limpo”. Porque não há esquerda sem direita, nem direita sem esquerda. O resto é propaganda anti-pluralista, adepta do autoritarismo e do totalitarismo.
Todas as revoluções foram pós-revolucionárias. 1789 produziu Napoleão. 1917 levou a Estaline. 5 de Outubro de 1910, o de Machado Santos, gerou Afonso Costa. 28 de Maio de 1926, dominado pelos republicanos anti-afonsistas, provocou Salazar. O 25 de Abril de 1974, o que teve um PREC, levou a este dia seguinte.
Mas convinha compreender que somos todos, simultaneamente, filhos do 28 de Maio de 1926 e do 25 de Abril de 1974, tal como todos temos um avô monárquico e um avô republicano, bem como um bisavô inquisidor, ou bufo da dita. O inferno está cheio de boas intenções e a história é apenas mero produto da ação dos homens, concretos, de carne, sangue e sonhos.
O 25 de Abril não foi um golpe de Estado nem uma revolução, mas uma onda em espiral que pode fazer renascer cada um de nós em libertação. Ainda está por cumprir, porque nunca existiu nem vai existir. Nenhuma das 10 000 000 de teorias científicas sobre a coisa é verdadeira, a não ser que rime com a verdade íntima de cada um dos projetos de cidadania.

Porque democracia tanto é o diálogo com o adversário, como a institucionalização dos conflitos. O 25 de Abril realizou-se.

(artigo originalmente publicado aqui)

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