Quando os autores presentes no Congresso de Milão de 1955 abordavam o crepúsculo das ideologias e, mais recentemente, Fukuyama acreditava no Fim da História, de certo que não previam uma reedição da Grande Depressão de 1929. Com efeito, nos anos que antecederam a presente crise até senhores como Ben Bernanke afirmavam que o ciclo económico estava controlado e as malfadadas agências de rating que tanto gostam de subestimar as contas públicas europeias davam luz verde a um subprime que se revelou ruinoso.
No entanto, o mercado financeiro e respectiva desregulação voltaram a toldar as nossas vidas, o que deveria representar uma segunda derrota do liberalismo económico selvagem depois da sua ressurreição após a crise petrolífera. Tal porém não aconteceu. Ao invés de laurear o modelo social que tanta protecção nos deu neste momento conturbado e de apostar numa maior regulação dos mercados financeiros, Bruxelas e o G20 apostam numa solução contra-cíclica de recuperação económica. O que estes senhores pedem é uma consolidação orçamental austera conciliada com a redução do papel do Estado na economia. Eu pergunto: fará algum sentido? A resposta vem em linguagem keynesiana que muitos sabem mas preferem ignorar. No momento acertado para estimular a procura agregada com base no investimento público dada a retracção do sector privado, ficamos sentados enquanto a mão invísivel nos faz cócegas, ou seja, nada.
O argumento é sempre o Euro. Não renego essa parte do problema mas coloco em dúvida a metodologia utilizada para alcançar o objectivo de contas públicas saudáveis que o fortaleçam e permitam o financiamento internacional dos Estados. O caminho imposto pela direita europeia até aqui consistiu em subida de impostos acrescida de redução de salários, acreditando que num futuro próximo os custos de trabalho reduzidos permitam a recuperação de empresas, o aumento da produtividade para posterior diminuição da fiscalidade. Eu tenho as minhas dúvidas de leigo em relação a esta questão. Não só não acredito no aumento da produtividade como não entendo a estratégia europeia de comércio internacional, dado que a nossa competitivade não passa pela precariedade dos trabalhadores mas sim pelo cluster tecnológico, pela inovação e qualificação, razão mais que suficiente para ter uma política de educação socialista e tendencialmente gratuita tal como se apresenta constitucionalmente. Como diria Pervenche Beres da Comissão de Emprego do Parlamento Europeu: Não somos a China e o modelo social chinês também chegará. As greves aliás já começaram.
Face ao exposto, resta-me dizer que o meu fervor ideológico nunca esteve tão aceso. Ontem vibrei com aquele que provavelmente foi o discurso mais envolvente e doutrinário do secretário-geral socialista. Este aliado à referência de Pedro Silva Pereira às raízes do socialismo democrático e da social-democracia (sentido ideológico do termo) recordaram-me a importância de figuras como Bernstein e relembraram-me que as ideologias vieram para ficar e as mundivivências moldam a nossa visão do mundo. Um mundo que espero mais justo daqui em diante. Afinal, enquanto houver ideologia existe esperança.
Frederico Aleixo, membro do secretariado da JS Alcântara
*Este texto encontra-se igualmente disponível no espaço notas do facebook da FAL-ONESES
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